Por: Liliane Moreira

A cada trabalho realizado nesses tantos anos de estrada sempre perguntei, silenciosamente, antes de aceitá-lo: “Para quê?”.

Já obtive vários tipos de respostas: Para aprender; Para empreender; Para inovar; Para sustentar meu filho; Para comprar uma casa…

É preciso não ter medo da pergunta, nem da resposta. Não podemos ter medo da resposta porque a resposta é nossa. Não podemos ter medo de nós. São os nossos anseios, nossos desejos, nossos medos, nosso modelo mental de sucesso, tudo junto forma a resposta.

Ela nos motivará a fecharmos o mês e recebermos o salário. Valeu a pena o esforço. Mais uma parcela da casa paga.

E assim vem mais uma parcela de orgulho, mais uma, mais uma, até que acordar pela parcela já não traz o bom dia natural.

O dia fica arrastado. A parcela parece tão alta…Teve juros este mês? O salário acabou mais cedo. Que trabalho chato…

Hora de fazer novamente a pergunta: Para quê este trabalho?

Oito ou nove parcelas depois e é possível que agora a resposta venha de forma incômoda, com a interrogação no lugar do ponto. Para comprar uma casa?

Mas só serve aquela casa? Tem que ser “a” casa? Aquela com a prestação mais alta e 30 anos pagando? Tem que ser mesmo? Naquele bairro apenas? Não ficaria bem morar noutro bairro? Não ficaria bem para quem? Para si ou para os outros?

Perceba que uma resposta incômoda gera várias outras perguntas incômodas. Não podemos criticar as pessoas que trabalham por trabalhar porque pode ser que a resposta dela ainda não a incomode. Ela segue firme na meta de comprar a casa. E não há nada de errado com ela. Mas se em você a resposta incomoda e você insiste, aí, sim, existe um problema.

Um caminho é escrever as respostas incômodas no papel. Isso evitará autossabotagens futuras. É só buscar as respostas no papel que toda a verdade renascerá, não vai dar para encobri-la com o véu da casa nova.

Tenho um grande exemplo no meu contágio social. Uma pessoa pela qual tenho grande admiração. Depois de 15 anos trabalhando numa escola, teve a coragem de pedir demissão devido aos tantos ecos em sua mente. As respostas estavam gritando! Ela já não conseguia mais reagir. O corpo pereceu. A relação familiar foi afetada, o lindo sorriso sumiu…

Por que?

Ela tinha uma casa com piscina que os filhos certamente gostavam, dois carros, viagens, tudo certo. Ou não?

Estava profundamente triste.

Resolveu não fugir mais das respostas e conseguiu mudar sua rota. Não mudou de área. Mudou de escola. E, embora continuando a resolver problemas na escola nova, ela deu-me o maior dos presentes hoje, Dia do Trabalho. Recebi a seguinte mensagem via celular: “Amiga, estou muito feliz!”.

O que pode ser melhor do que saber que uma pessoa querida está muito feliz?  E ainda mais uma pessoa que estava tão infeliz?

E por que essa felicidade toda? Ganhou bônus? Promoção? Vai reformar a casa? Ainda não. Ela tinha até mais vantagens financeiras no antigo emprego. E tem metas de melhorar esse ponto. Mas hoje ela está imensamente feliz porque o seu “para quê” foi respondido de forma alinhada ao sentido maior de seu trabalho.

Estava feliz porque recebeu feedbacks positivos tanto dos pais dos alunos quanto do seu chefe. Ambos apresentaram os avanços que o trabalho dela está proporcionando para o melhor aprendizado dos estudantes. “Estou feliz!”, repetiu, talvez para que ela mesma não esqueça. Não há nada mais gratificante do que a sensação de estarmos sendo útil com o que sabemos fazer.

Em tempos de crise econômica, poucas ofertas de emprego, é, sim, compreensível que pessoas permaneçam trabalhando onde estão incomodadas. Mas se o eco incômodo continuar por meses, será prudente traçar um plano b e reescrever a própria história, experimentar a satisfação de trabalhar por um sentido. Quem experimenta não abre mão por muito tempo, pois dá trabalho trabalhar assim.